“Portugal is not Greece”. Here’s why.

Os últimos dias têm sido complicados para Portugal, com notícias na imprensa estrangeira de que Portugal vai ter de pedir nova ajuda financeira e que Portugal não vai poder regressar aos mercados em 2013. Bem sei que repeti Portugal três vezes na última frase, mas mostra bem como passámos a ser o foco de toda a atenção – ao ponto de muitos acharem que seremos a próxima vítima, depois do problema da Grécia estar em vias de ser resolvido.

Hoje foi mais um dia em que os nossos governantes (desde o Primeiro-Ministro até ao Ministro das Finanças) se esforçaram por passar a mensagem que “Portugal não é a Grécia”, ou “Portugal is not Greece”, se preferirem. Na blogosfera e também nos mercados financeiros domina a ideia de que não devemos acreditar em nada, até ser oficialmente desmentido.

Contudo, em vez de ler mais uma dezena de opiniões que nada parecem adiantar, talvez seja melhor olhar para os dados estatísticos, assumir umas hipóteses razoáveis e fazer umas continhas. Isto para percebermos afinal em que posição relativa está Portugal. Os dados utilizados são os da Comissão Europeia (AMECO) e estão disponíveis online a custo zero.

Comecemos com a equação dinâmica da dívida pública:

\displaystyle B_{t}=B_{t-1}(1+i_{t})-SP_{t}

onde {B_{t-1}} é o volume de dívida do período anterior, {i_{t} } é a taxa de juro nominal, e {SP_{t}} é o saldo primário a preços correntes. O saldo primário é simplesmente a diferença entre as receitas e as despesas, sendo que nas despesas não incluimos o serviço à dívida pública, i.e. os juros que pagamos.

A partir desta equação, podemos rescrevê-la como percentagem do PIB (é um bom exercício que deixo para todos os alunos de economia e de finanças públicas que lêem este blog) como:

\displaystyle b_{t}=b_{t-1}\frac{1+i_{t}}{1+\gamma _{t}}-sp_{t}

onde {b_{t}} é o rácio entre a dívida pública e o PIB (produto interno bruto), {sp_{t}} é o saldo primário expresso também em percentagem do PIB, e {\gamma _{t}} é a taxa de crescimento anual do PIB.

Nos últimos dias apareceu na revista alemã Der Spiegel a seguinte figura referente aos haircuts ou restruturações da dívida pública para que estas fossem sustentáveis.

Não querendo replicar estes números, fiz algo diferente: Determinar qual seria o aumento do rácio dívida pública/PIB de cada país em 2012 sob determinadas hipóteses. Que hipóteses são essas? Simplesmente assumi que {sp_{2012},} {i_{2012},} e {\gamma _{2012}} eram iguais às médias registadas no quinquénio entre 2007 e 2011. Bem sei que estes anos incluem os efeitos da crise financeira internacional, mas julgo que essa é uma vantagem da escolha do horizonte, especialmente dado que a crise tem características permanentes.

Portanto o objectivo foi calcular {\Delta b_{2012}=b_{2012}-b_{2011}} sendo que {b_{2011}} é um dado estatístico.

Ora

\displaystyle \Delta b_{2012}=b_{2011}\left( \frac{1+i_{2012}}{1+\gamma _{2012}} -sp_{2012}-1\right) .

Com vista a ser o mais completo e transparente possível, vale a pena referir EXACTAMENTE que dados da AMECO usei. Para o {i} usei o “Implicit interest rate: general government :- Interest as percent of gross public debt of preceding year (%)”, para o {sp} usei o “Net lending (+) or net borrowing (-) excluding interest: general government (expresso já como percentagem do PIB)”, para o {b} usei o “General government consolidated gross debt :- Excessive deficit procedure (expresso já em percentagem do PIB)”, e finalmente para calular o {\gamma } usei como série de base o “Gross domestic product at current market prices :- Reference level for excessive deficit procedure”.

Vejamos então a que resultados cheguei. A figura está em inglês simplesmente porque irei reutilizá-la para outros fins. 🙂

Conclui-se que, num conjunto de trinta e um países, Portugal aparece como o quinto pior, com países como a Irlanda, Grécia, Reino Unido e Estados Unidos à sua frente. Se as hipóteses que adoptei se concretizarem então estes quatro países exibirão um aumento do rácio de dívida pública no PIB mais significativo do que em Portugal. Vale a pena caracterizar melhor os resultados. Primeiro, o número para a Irlanda provavelmente não se concretizará, simplesmente porque este país registou um decréscimo do seu PIB nominal em média entre 2007 e 2011, algo que dificilmente ocorrerá em 2012. Segundo, países como o Reino Unido e os Estados Unidos têm moedas próprias, o que lhes permite atenuar este problema de financiamento, não só pela receita de senhoriagem (que advém da cunhagem de moeda própria) como também pelo facto de as obrigações dos dois países – os Gilts e os Treasuries, respectivamente – serem um destino de preferência em circunstâncias de maior turbulência nos mercados financeiros. Finalmente, dado que o esforço orçamental em Portugal está a ser muito mais expressivo em 2012 do que foi em média durante 2007-2011, há boas razões para pensarmos que já estaremos possivelmente mais próximos da França do que da Grécia.

Curioso, também, é verificar como a Itália aparece ligeiramente melhor do que a média da UE a 27 estados membros, e que o Japão, o Chipre e a Bélgica estão melhores do que eu próprio pensava. Espectacular mesmo são os resultados dos seis países no pelotão da frente – Noruega, Suécia, Canadá, Finlândia, Eslováquia e Luxemburgo – que contribuem para a estabilidade na Europa. É caso para dizer: “Quem tem receitas de petróleo e gás, tem quase tudo!”.

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Sobre Pedro G. Rodrigues

Investigador integrado no Centro de Administração e Políticas Públicas (CAPP) e Professor Auxiliar do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Universidade de Lisboa. Doutorado em economia pela Universidade Nova de Lisboa. Email: pedro.g.rodrigues@campus.ul.pt
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2 respostas a “Portugal is not Greece”. Here’s why.

  1. Jorge Bravo diz:

    Interessante e um pouco inesperado, mas se já estivesse lançado o Cluster do Mar como o Prof. Ernâni Lopes recomendou, talvez o polotão do Gás tambem fôsse nosso!

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