Face às interrogações que surgiram na sequência do meu artigo de opinião publicado na edição de ontem do Jornal de Negócios, entendo que vale a pena frisar o que me parece ser o essencial da minha ideia.
Trata-se de uma abordagem pouco ortodoxa? Claro que sim. Em condições normais e no contexto de uma política monetária única, compete à politica orçamental estabilizar a economia e atenuar a amplitude das flutuações económicas. Mas não há margem orçamental para isso, como todos sabemos.
E não haverá outros instrumentos à disposição do Estado? Foi nesse sentido que o artigo deve ser entendido. A alternativa que propus parece-me melhor que outras como o confisco Cipriota, a saída de Portugal do euro, o pagamento dos subsídios de férias e de Natal em dívida pública, ou o continuar a jogar dinheiro dos contribuintes para um poço sem fundo (o que leva analistas à esquerda e à direita a dizer que a austeridade produz sacrifícios sem resultados). Mas é neste contexto de escolhas muito pouco confortáveis que nos encontramos. Assobiar para o lado ou enfiar a cabeça na areia não é a solução. De resto, a solução que propus está ao nível do serviço militar em tempo de guerra – claro que noutro contexto aquelas pessoas poderiam estar a fazer algo mais produtivo, mas isso seria noutro contexto.
O ponto essencial é que a) a consolidação orçamental veio para ficar, e b) há que encontrar uma forma de viver com ela, atenuando os efeitos negativos que tem sobre a economia. Lá porque o Estado não pode gastar dinheiro para estabilizar a economia, isso não quer dizer que é impotente. Aliás, qual a diferença entre o que proponho e o Estado estabilizar a economia a partir de excedentes orçamentais que foram acumulados em anos anteriores através de receitas de impostos que foram maiores que as despesas (só assim se acumulou um saldo positivo)? A diferença é que quando o Estado injecta dinheiro na economia neste ou naquele programa podemos nem beneficiar com isso. Normalmente aqui aparecem os lobbies. Na minha proposta pelo menos as pessoas têm retorno pelo dinheiro que gastam (reparem que a alternativa seria pagar esse montante em impostos e ter um retorno muito pequeno), e podem escolher a composição do seu carrinho de compras. E não, não tem de ser em “tretas consumistas”, pode muito bem ser em investimento ou exportações como refiro no artigo.
O leitor mais atento ter-se-á apercebido que em lado algum eu refiro a escala da medida a discutir. É perfeitamente legítima a preocupação que muitos expressaram em termos do respeito pela propriedade privada e pelo carácter sacrossanto dos depósitos. Aceito isso, mas a ideia no seu essencial pode ser aplicada a uma parte do rendimento das pessoas, por exemplo a uma parte dos reembolsos em sede de IRS. Só não optei por essa alternativa (que serviria igualmente e teria o mesmo resultado prático) porque seria acusada de ser desigual, fazendo incidir a medida apenas sobre alguns e não sobre todos. Mas o essencial da ideia é impor um prazo de validade sobre uma parte do rendimento, não tem de mexer com o património dos Portugueses.
Claro que ninguém tem prazer em pagar impostos ou a ser coagido ao que não quer fazer (mesmo que apenas não o faça porque, como outros, tem medo do futuro), mas vivemos em sociedade e o bem estar de todos é cada vez mais interdependente.
Quem acha que esta ideia é má (com todos os insultos da praxe para quem a teve) que a combata com uma ideia melhor. Fica aqui o desafio. É o que se faz em democracia. No reverso da medalha da liberdade de expressão está a responsabilidade na acção.