Vem aí a artilharia pesada?

É já amanhã, dia 5 de Junho, que o Banco Central Europeu (BCE) anuncia as medidas que vai adoptar para combater a deflação na área do euro. Lembro que, ao contrário da inflação que é uma subida generalizada do nível dos preços, a deflação é a descida generalizada dos mesmos.

Poderá o leitor estar a pensar “Qual o perigo de uma deflação?”. Afinal, quem é que não gosta de pagar preços mais baixos? O elemento essencial na discussão da deflação são as expectativas dos agentes económicos. Vamos ver um exemplo. Imagine que quer comprar um electrodoméstico qualquer. No seu passeio habitual pelos centros comercias, encontra um modelo que o agrada. Olha para o preço: 350 euros. E pensa para si, “Ok, gosto, volto cá na próxima semana quando já tiver recebido o meu salário”. E assim faz, só que quando volta à mesma loja, vê o mesmo artigo com um preço de 300 euros. Provavelmente, pensa que é o seu dia de sorte 🙂 mas depois olha ao seu redor e repara que a maioria dos preços está mais baixo. Hummm … e é aí que entram as expectativas. Muito provavelmente vai pensar, não vou levar já volto cá daqui a uns dias. Estou a acelerar o processo que obviamente pode levar semanas e não dias. Mas o ponto fundamental é que a sua expectativa de que se esperar e não comprar já o artigo poderá consegui-lo a um preço ainda mais baixo, pode – se for um comportamento generalizado – iniciar uma espiral deflacionista. Ora vejamos porquê, colocando-nos do lado do comerciante. Ele tem um stock a acumular. Quer livrar-se deste artigo o mais depressa possível para colocar o novo modelo. Decidiu baixar o preço e nem assim conseguiu vender. Aliás, repara que a concorrência começou a fazer o mesmo e todos (ou a maioria dos consumidores) está agora à espera de novas descidas de preço. Chega a um ponto em que o cliente decide que não vai esperar mais tempo, desloca-se à loja mas depois repara que esta fechou e todos os funcionários foram despedidos. Estes funcionários, agora com menos rendimento disponível, muito provavelmente vão gastar menos do que gastavam. E assim a procura agregada (a quantidade total de bens e serviços que se compram numa economia) começa a encolher … podendo dar início a novas rondas de despedimentos.

Face a uma possibilidade como esta, o Banco Central Europeu reuniu-se recentemente em Sintra para discutir o que fazer. Foi neste fórum que o Nobel Paul Krugman sugeriu que o BCE aumentasse o seu objectivo para a inflação de 2% para 4%. Que outras medidas é que estão a ser consideradas?

Chris Giles, o editor de economia da revista Financial Times, preparou um pequeno vídeo (em inglês) sobre taxas de juro negativas. A ideia é incentivar os bancos comerciais a emprestar a empresas e a particulares em vez de simplesmente manter um grande volume de liquidez parado junto do BCE. Será que funcionará? A resposta, como espero que o leitor já tenha antecipado, é que depende da forma como a medida alterará as expectativas dos agentes económicos quanto à trajectória do nível de preços.

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Sobre Pedro G. Rodrigues

Investigador integrado no Centro de Administração e Políticas Públicas (CAPP) e Professor Auxiliar do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Universidade de Lisboa. Doutorado em economia pela Universidade Nova de Lisboa. Email: pedro.g.rodrigues@campus.ul.pt
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