No final de Junho de 2010, Olivier Blanchard e Carlo Cottarelli do FMI apresentaram no blog iMFdirect dez mandamentos para o ajustamento orçamental em países desenvolvidos. Trata-se de dez ideias que podem orientar os Governos da OCDE no desenho do seu exit strategy, a estratégia pela qual a política orçamental regressa à normalidade depois da Grande Recessão.
Em todos os países da OCDE a forte desaceleração da actividade económica registada durante a crise levou à contracção das bases fiscais e contributivas, o que implicou uma significativa redução da receita pública. A este facto acrescentaram-se (e bem!) sucessivos pacotes de estímulo orçamental para suster a procura agregada, o que implicou um forte aumento da despesa pública. Como tal, os défices orçamentais aumentaram e acumularam-se elevados rácios de dívida pública / PIB que, a prazo, têm de ser reduzidos.
Aqui ficam então os dez mandamentos com vista a restabelecer uma política orçamental normal.
Mandamento 1. Deve-se ter um plano credível para a redução do défice, com uma meta quantitativa a médio prazo.
Mandamento 2. A não ser que o país enfrente dificuldades em se financiar no exterior, a redução do défice não deve ser concentrada nos anos iniciais (não deve ser front-loaded).
Mandamento 3. Deve-se ter como objectivo de médio prazo uma redução do rácio de dívida pública no PIB.
Mandamento 4. Deve-se privilegiar a redução de despesa pública como instrumento de redução do défice orçamental.
Mandamento 5. Em virtude do custo para as finanças públicas do envelhecimento da população, devem ser aprofundadas as reformas dos sistemas públicos de pensões e de saúde.
Mandamento 6. Deve-se assegurar um ajustamento orçamental equitativo entre as diversas classes da população.
Mandamento 7. Devem ser implementadas reformas estruturais (nos mercados financeiros, de bens e do trabalho) visando acelerar o crescimento potencial da economia.
Mandamento 8. Devem-se reforçar as instituições orçamentais (por exemplo, através de um Conselho Orçamental independente).
Mandamento 9. Deve-se coordenar melhor a política monetária com a política orçamental.
Mandamento 10. Deve-se coordenar melhor as políticas económicas entre países, procurando por exemplo evitar fenómenos como a concorrência fiscal em que os países tentam (sem sucesso) ganhar competitividade uns aos outros reduzindo sucessivamente a sua taxa de IRC, resultando apenas numa redução da receita nos dois países.
Seguem-se algumas perguntas para dar o kick-off do debate:
a) À luz destas orientações, Portugal é um bom ou um mau aluno? Que mandamentos deveria seguir melhor? Haverá outros mandamentos mais importantes que estes?
b) Qual o ritmo a que se deve reduzir o défice orçamental? Que tal reduzir em cada ano o saldo orçamental estrutural em 1 pp? Será suficiente?
c) Será que o ajustamento orçamental se deve fazer apenas do lado da despesa? Não fará também sentido alargar as bases fiscais e contributivas?
d) Fará sentido, na actual conjuntura, implementar reformas estruturais que aumentem a poupança?
e) Deverá figurar como regra constitucional a obrigação de ter contas públicas equilibradas ao longo do ciclo económico? Que vantagens e que dificuldades operacionais?
Queremos ouvir a sua opinião. Participe!
Obviamente que a despesa não deve ser centrada nos cortes salariais da função publica, até porque não passa de uma “batota” orçamental, desmotivar os sectores da educação, justiça, saude e segurança não podem ser solução. A despesa está nos milhões que se injectam em negocios falidos do estado e nao em salários.
O futuro passa por tornar o Estado auto-suficiente, nacionalização de negocios com lucro e alienação de empresas com prejuizo.
Como sabe, as chamadas remunerações certas e permanentes são a maior fatia da despesa pública. Nesse sentido, é inevitável que uma consolidação orçamental inclua também uma redução da massa salarial. Contudo, há várias formas possíveis de o fazer. A opção tomada certamente foi tida como a mais equitativa, i.e. a que melhor distribui os sacrifícios do ajustamento orçamental que é necessário fazer. Que alternativas haveria, dentro da opção reduzir a massa salarial na função pública? a) Despedir alguns funcionários públicos – note que qualquer empresa do sector privado que estivesse com dificuldades financeiras optaria por um downsizing deste tipo; b) Tornar a redução salarial selectiva – por exemplo, usando a avaliação dos funcionários públicos (dados recolhidos através do SIADAP) para que os funcionários com piores avaliações sofressem maiores cortes na sua remuneração. Podia não ser a solução mais equitativa, mas certamente que daria os incentivos certos no sentido da melhor performance pois nunca se sabe quando será a próxima “leva” de cortes; c) Dar uma tarde livre a todos os funcionários públicos a troco de um corte de 5% na sua remuneração (salvaguardando a continuação dos serviços tidos como indispensáveis) – será que o cidadão notava a diferença? Existem obviamente outras alternativas. Diz que cortar salários é uma batota orçamental … Bem, uma consolidação orçamental duradoura tem de ser tal que, passados alguns anos, temos a certeza que a poupança vai ser definitiva. Será que neste caso os funcionários públicos não recuperarão o que lhes é cortado agora? Talvez.
Finalmente, é preciso reconhecer que o modelo orçamental actual está esgotado. É urgente fazer a transição para um Orçamento do Estado baseado no desempenho. O Francisco Louçã falava de um Orçamento Base Zero há umas semanas e é certamente um contributo no sentido certo. Contudo, o chamado ZBB (Zero-Based Budgeting) já está ultrapassado pelo chamado PBB (Performance-Based Budgeting). O Governo já tem trabalhos preparatórios neste sentido e está a implementar esta reforma. A ideia é que tenhamos uma ideia mais informada do que cada euro gasto pelo Estado nos dá. Qual a qualidade da despesa pública? Só assim é que pode haver uma racionalização duradoura dos meios que são colocados por todos os contribuintes ao serviço da sociedade. Até lá, o ajustamento orçamental terá de ser inevitavelmente feito “à martelada”, não porque os políticos sejam mal intencionados, mas simplesmente porque o modelo orçamental que usam não lhes permite muito mais.
Uma última nota. Fala, e bem, em tornar o Estado auto-suficiente. Mas isto é apenas uma forma mais coloquial de dizer que defende que as finanças públicas sejam sustentáveis. Só assim é que o Estado não nos vem pedir mais um ou dois ou três pontos percentuais a mais de IVA, ou nos corta inesperadamente a nossa pensão de reforma. Mas isto passa por gerir melhor os recursos que são colocados à disposição do Ministro das Finanças – i.e., a receita de impostos, taxas, etc. Que o investimento público deve ser inteligente no sentido de produzir o maior impacto sobre a riqueza do país, sem dúvida. Que os “investimentos” como Casas da Música, CCBs, estádios de futebol e outros tais poderiam (deveriam?) ter sido evitados? Talvez. Ou então só deveriam ter sido realizados depois de intervir noutras áreas prioritárias como o saneamento básico. Mas, entende-se, que talvez o saneamento básico não seja o assunto mais sexy para um político. Pode não ser sexy, mas é necessário.
O que não concordo, de todo, é a parte final do seu comentário. Se uma empresa pública dá prejuízo, porque é que alguém do sector privado a quereria comprar? Porque a podiam gerir melhor? Talvez. Mas se assim for, implicitamente acha, e bem, que o sector privado tipicamente gere melhor a actividade económica do que o Estado. Mas nesse caso, não queira nacionalizar os negócios com lucro como diz. Exija que paguem os impostos que devem pagar, mas não faça de tudo para lhes dificultar a vida. Aliás, quanto mais lhes facilitar a vida mais cairá a taxa de desemprego. A nossa prosperidade depende da existência de empresas de sucesso!
Acho que estamos finalmente a chegar à conclusão, como país, que se queremos manter o nível de vida a que nos habituámos desde 2000, temos que nos esforçar mais e ser mais inteligentes e criteriosos quer com o nosso dinheiro quer com os nossos governantes. Temos que pensar por nós próprios e exigir, exigir e exigir.
Sim, o futuro passará certamente por um país mais empreendedor, mas nesnte momento exacto, o que me parece é que os cortes salariais na função pública não sejam medida suficiente para “aguentar” a crise, se calhar todos nós teremos que contribuir com parte do nosso salário.