Será a dívida pública um activo líquido?

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Esta semana um aluno muito perspicaz discordou quando eu lhe disse que um título da dívida pública que um privado comprava (seja um certificado de aforro, um bilhete do Tesouro ou uma obrigação do Tesouro) não era um activo líquido (para a sua dinastia), pois apenas representava a obrigação do Estado aumentar impostos no futuro para liquidar a mesma dívida entretanto contraída. Eu disse que a compra de um título de dívida pública era, na sua essência, um adiantamento que faziam dos impostos a pagar ao Estado (como se adiantava o dinheiro, pagava-se menos em valor actual, mas isso era apenas o valor temporal do dinheiro). Até brinquei dizendo que quem gosta de pagar impostos e acha que paga pouco e quer pagar mais, pode comprar um título de dívida pública … 🙂

Mesmo dando de barato que ele estaria ainda vivo para ter de pagar o acréscimo de impostos, dizia-me (com muita perspicácia, devo acrescentar) que o título da dívida pública adquirido por ele só seria uma antecipação do imposto a pagar ao Estado no caso de assumirmos que este só transfere rendimento entre agentes económicos, com custos de eficiência. De facto, se os recursos que emprestarmos ao Estado servirem para este implementar políticas que expandem a base fiscal de forma permanente, então o título de dívida pública é um activo líquido porque o imposto a pagar em valor actual será menor do que não ter comprado a dívida pública. De forma equivalente, se ao emprestar ao Estado agora mais dinheiro evitamos que ele tenha de pagar uma taxa de juro ainda mais elevada que depois se repercute em mais impostos ou mais austeridade no futuro, então vale a pena.

Devo dizer que fiquei impressionado com os argumentos dele. Disse-lhe que tinha de pensar, mas acabei por concordar com ele. 🙂

Assim, o ponto fundamental parece ser o que o Estado faz com o dinheiro que nós lhe emprestamos. Se for apenas transferir recursos ou pior (actividades que são efectivamente desperdício), então nesse caso os títulos de dívida pública tenderão a não ser um activo líquido.

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Sobre Pedro G. Rodrigues

Investigador integrado no Centro de Administração e Políticas Públicas (CAPP) e Professor Auxiliar do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas, Universidade de Lisboa. Doutorado em economia pela Universidade Nova de Lisboa. Email: pedro.g.rodrigues@campus.ul.pt
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Uma resposta a Será a dívida pública um activo líquido?

  1. Emanuel Santos diz:

    O argumento do aluno é essencialmente a tese da chamada equivalência ricarduana, isto é, a total indiferença entre pagar agora com impostos a despesa do Estado ou pgar depois, com impostos futuros o défice público que acresce à dívida. Como em geral acontece com todas as teses na teoria económica, a sua verificação depende do contexto histórico e do grau de “perfeição” do funcionamento dos mercados financeiros. Para mim, contnuo fiel à regra de ouro das finanças públicas – não a do Tratado Orçamental de inspiração germânica mas a que estabelece que o défice, se existir, não deve ultrapassr o valor do investimento público.
    Emanuel Santos

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